um post do Luis Filipe Silva levou-me a querer impingir-vos um excerto de uma coisa que eu tinha escrito para a Umbigo a propósito de um tema muito semelhante.
Aparentemente, o futuro não está na moda: já vimos o suficiente, soubemos o suficiente, previmos o suficiente, para ficarmos (suficientemente) decepcionados. Afinal, o nosso presente era suposto ser o futuro e revelou-se estar envenenado. A tecnologia confirmou-se como um meio e não um fim, simultaneamente mais e menos do que si própria, mas uma das facetas dos amanhãs afónicos que mais ajudou a escavar a fossa foi a ausência de Outros. Neste tempo todo, sempre estivemos esperançados que nos encontrassem, que afinal fôssemos uma espécie de filhos perdidos numa ilha experimental à volta de uma estrela de classe G2 e que portanto tudo tivesse desculpa. Mas não. Por enquanto, continuamos teimosamente sós. E à deriva, no presente, embrulhado num futuro com sabor a ficção anacrónica. Quererá isto dizer que a ficção-científica (f-c), como género literário, perdeu o seu sentido? O seu timing? O seu carisma? A sua posição no ranking de vendas da Amazon? Bem, pelo menos vêem-se menos livros à venda, os autores do género parecem menos mediatizados e sim, sente-se um gosto amargo a crise. De mentalidades, sobretudo. Porque nunca precisámos tanto de boas obras de f-c.
Quando as coisas estão más, não gostamos muito de ler para o futuro, imediato ou não; preferimos ler para o passado, real ou não. O futuro tende a desiludir e os bons livros raramente foram optimistas, pelo menos em termos de evolução estatística da Humanidade - os heróis solitários são outra(s) história(s). Será talvez por isso que o género da Fantasia tem tido um êxito sem precedentes: uma misturadora eficaz de elementos históricos (normalmente de raíz mítica ou medieval), românticos, de aventura pura (ver romances de capa e espada), e de magia (ou sobrenaturais, que possam alterar o fluxo da realidade), são os ingredientes adequados para um passado alternativo, para uma possibilidade de que as-coisas-poderiam-afinal-não-ser-bem-assim. Os sonâmbulos funcionais que nós somos adoram sonhar que poderiam ter sido personagens de sonho, com poderes superiores aos de um comando universal, com uma pitada de medo, transformação e maturação, como as histórias de embalar, que os conforte na esperança de que pode haver esperança até para eles, pelo menos num dos universos alternativos possíveis. Se um mau passado nos pode desculpar, um bom passado (mesmo que ficcional) pode ser uma porta para o Verão do… futuro (real). E se a f-c também alberga estes instrumentos da narrativa para criar leitores interessados, propondo Histórias alternas, passados modificados, visões utópicas, perspectivas mordazes e até finais esperançosos (além de um uso espantoso da linguagem e dos nomes), a sua postura é inerentemente contemporânea dos tempos em que é escrita, o seu presente um fundíbulo crítico para as molduras dos horizontes de eventos das suas histórias.